Um encontro rapsódico, nosso texto tecido a três vozes. Por Gisele Vasconcelos.
O cantante da Colômbia, a brincante do
Maranhão, o violeiro caipira se encontram para constante mutação nas vozes dos
atores-rapsodos: Jhonny Alexander, Gisele
Vasconcelos e Luiz Laranjeiras.
Um encontro apaixonado,
cuja costura de vozes e cânticos foi tecida pelo fio da memória da tradição de
cada chão. A rapsódia levou ao pé da letra a epistemologia da palavra rapsodo, no
sentido de “costurar” ou de “ajustar cânticos”.
No encontro rapsódico os atores
brincantes costuraram sua fala alinhavando o épico e o lírico com seus cantos e
narrações trazendo para a movência um poema de Llanero, uma moda de viola,
ladainha e versos de cantigas, numa junção de procedimentos da escrita, utilizando
da montagem e colagem para compor o mosaico de sonoridades.
A respeito desse encontro, vimos um ressoar,
em vozes, de um conjunto harmônico, às vezes embalado por uma narrativa, às
vezes desprovido dela, embalado tão somente pela troca de palavras, risadas, versos,
toques, que se entrecruzaram assim como entrecruzam seus atores, vindos de
territórios que ultrapassam os limites de uma só localidade, para o encontro
movido pela multiculturalidade.
Em montagem dinâmica, investimos nas
vozes intercaladas, sobrepostas e também num jogo de pergunta e resposta,
acompanhadas ao som do pandeiro, viola caipira e zampoña, numa rapsódia
polifônica propensa à mistura, à pluralidade, à heterogeneidade.
Em alguns momentos, compõe a rapsódia fragmentos
da narração em terceira pessoa, de episódio do coplero Florentino e seu desafio
com o Diabo, num misto de fala e canto ou a moda de namoração da voz do
violeiro, em primeira pessoa: “Eu já tive um sentimento / Que nem pude suportá
/ De uma morena bonita / Que cumigo quis casá.”
Essas lembranças da tradição popular
são transformadas e ajustadas para a recriação da rapsódia colombiana-maranhense-caipiracicaba
numa intevocalidade bilíngue, jogo vocal de sotaques, mobilizável em novo
discurso.
“O poeta joga, como registros de um
instrumento, com o material tradicional, bem demarcado – lugares-comuns
retóricos, motivos imaginários, tendências lexicais – segundo os níveis de
estilo, os gêneros ou a finalidade proposta ao discurso” (ZUMTHOR, 1993, p.148)
Discurso dividido em momentos líricos: “Quando pego na viola/“Inté”
a lua chora/ E apaga toda a cidade/ Com meu canto de “sodade”.” Ou em momentos
narrativos: “ El coplero Florentino/ por el ancho terraplén/caminos del Desamparo/
desanda a golpe de seis.” Dessa costura de texto –tecido, uma consideração para
esse encontro de paixão: “Se eu soubesse que vocês vinham/ aqui eu já
tinha vindo/ não tinha ficado em casa/ na minha rede dormindo.”
ver vídeo em http://www.youtube.com/watch?v=mRh13gIv1i8&feature=share
ver vídeo em http://www.youtube.com/watch?v=mRh13gIv1i8&feature=share
Referências Bibliográficas:
SARRAZAC,
Jean-Pierre. Léxico do Drama Moderno e Contemporâneo. São Paulo. Cosac Naify,
2012.
ZUMTHOR,
Paul. A Letra e a Voz: a literatura medieval. São Paulo: Companhia das Letras,
1993.
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